
Tudo sobre Inteligência Artificial
O Olhar Digital comemorou 20 anos no evento Spotlight, que explorou os efeitos da inteligência artificial no mercado. A palestra Criatividade e Tecnologia: O papel da IA no Futuro da atenção abordou o papel da tecnologia no mercado da atenção e informação, como na produção de conteúdo e no jornalismo. Por exemplo, a IA produz conteúdo original? E como lidar com os direitos autorais dessa produção?
Especialistas opinaram. Entre eles, Guilherme Ravache, empreendedor e colunista do Valor Econômico; Rafaela Lotto, sócia e head da empresa de influenciadores YOUPIX; Flávio Moreira, jornalista de estratégia e inovação no mercado de mídia e atual Coordenador de Parcerias e Estratégia do InfoMoney; e Pyr Marcondes, investidor, jornalista e sócio sênior do Pipeline Group.

Guilherme Ravache, que mediou a conversa, começou o papo com uma analogia interessante: com a inteligência artificial, as big techs estão vivendo um momento semelhante ao da popularização da internet, quando o jornalismo impresso teve que se adaptar para o ambiente digital. Agora, é a vez das empresas de tecnologia se reinventarem. Nesse processo, elas terão que investir muito dinheiro – e possivelmente perderão muito dinheiro.
Mas estaria o mercado saturado dessa inovação?
Para Rafaela Lotto, que trabalha com influenciadores, a IA surgiu como um elemento a se prestar atenção, mas veio acompanhado de um certo alarmismo (como a possibilidade de substituição de trabalhadores humanos pelas máquinas). Ela tranquiliza:
Olhamos para o aspecto humano da influência. O influenciador coloca o contexto em um produto ou marca de uma forma que nenhuma outra mídia consegue. O mercado está saturado da influência? Não está saturado do conteúdo, mas sim do conteúdo igual.
Rafaela Lotto
Ela cita os resultados de uma pesquisa que conduziu no âmbito interno de YOUPIX. Um dos destaques foi que as pessoas se sentem menos incentivadas a consumir um conteúdo criado por IA. Ou seja, ao mesmo tempo que a tecnologia permite aumentar a criação e outros processos, não chega a ser uma ameaça aos humanos. Lotto a enxerga como uma forma de aumentar a produção.

IA x conteúdo de qualidade
O aumento da produção não significa qualidade. No jornalismo, isso é algo a se pensar.
Flávio Moreira destaca que, considerando que o Brasil é um país grande e que nem sempre as notícias chegam em todos os lugares, uma produção de menos qualidade feita com IA, mas que chegue em mais lugares, está cumprindo um papel que o jornalismo não conseguiu.
No entanto, há o lado contrário: “em locais onde o conteúdo é servido, a qualidade faz diferença”, afirma. Ele também lembra a importância de não ter apenas um “conteúdo commodity” para conquistar mercado.
Já para Pyr Marcondes, a questão não é necessariamente a qualidade. A IA está presente desde a produção até a edição, distribuição e comercialização. A questão é: o quanto os leitores conseguem perceber a diferença. Ele chama atenção para a importância de manter a qualidade mesmo usando inteligência artificial, com um processo de edição ou revisão refinado.
Ravache aproveitou para emendar uma questão em alta atualmente: devemos nos preocupar com a IA? Marcondes, que usa a tecnologia ativamente em seu dia a dia para produção de conteúdo, tem uma resposta ampla: depende. Para quem enxerga a IA como um bônus, ela pode ser boa, não um motivo de medo. Já quem não a vê assim, pode não sobreviver no mercado – e aí está o problema.
Depende quem tem medo e o quanto você está preparado. É inevitável, acho que temos todos que nos adaptar.
Pyr Marcondes

Inteligência artificial produz conteúdo original?
Ravache lembra que, com a inteligência artificial, o valor do produto muda. Estaria a IA produzindo conteúdo original? E isso é bom ou ruim?
Para Flávio Moreira, se os produtores treinarem a tecnologia para produzir conteúdo original a seu favor, chegará um momento que a máquina vai se retroalimentar e nada mais será original. Seria um paradoxo. Ele dá um exemplo: se o Google começar a oferecer um resultado pronto baseado em um site, mas sem necessidade do usuário clicar no link, o buscador estaria ‘matando’ o modelo de negócio do site. Porém, se o site ‘morrer’, o Google não terá mais conteúdo para exibir.
Nesse sentido, Rafaela Lotto destaca a importância de um conteúdo autêntico, que dialogue com o público. No caso dos influenciadores, não adianta produzir mais, se o público não se sentir conectado.
O algoritmo vai servir aquilo que a audiência gosta de receber… que muitas vezes é o que dialoga com o público pela autenticidade. A cópia pela cópia, ou pela IA, não é original. Por que um vídeo funciona mais do que outro? Não ter cara de publicidade funciona muito melhor. A capacidade do criador de conteúdo é criar comunidade, algo que a IA não faz.
Rafaela Lotto
Ela também destaca a criatividade do criador brasileiro, algo que a IA não consegue alcançar. A vantagem da tecnologia é permitir exponenciar a criatividade.
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Já Pyr Marcondes acredita em uma espécie de ‘terceira via’. Ela cita uma situação curiosa: ele usa chatbots rotineiramente para produzir textos personalizados. Certo dia, foi viajar e pediu dicas para a IA. Quando voltou de viagem, a ferramenta perguntou qual foi a parte favorita do passeio e ele respondeu que havia sido a miscigenação cultural. Então, a IA sugeriu que ele se aprofundasse no tema em um artigo para as redes sociais. Marcondes teve uma nova ideia: pediu que a própria ferramenta escrevesse esse artigo, o qual, no final, ele editou antes de publicar.
Ele destaca como os humanos têm criatividade e como a IA tem criatividade, de jeitos diferentes. Em ambos os casos, as produções são originais, ainda que de formas diferentes. No entanto, se trabalharmos em conjunto com a tecnologia (como ele fez), podemos criar um terceiro tipo de criatividade.

E onde ficam os direitos autorais?
Rafaela lembra como, no âmbito da publicidade e da produção de conteúdo para influenciadores, direitos autorais são pouco regulados. Isso porque é praticamente impossível definir o “dono de um conteúdo”. Flávio concorda: o jornalismo tem o mesmo problema. Até hoje, não definimos, dentro da profissão, quem é o “dono da notícia”.
Ambos acreditam que a IA pode ajudar a identificar quem foi o primeiro a produzir tal conteúdo ou o fez com mais detalhamento. Ainda assim, não temos uma definição de autoria exata.
Já Pyr defende que, com tanto conteúdo disponível, chega um momento em “perdemos a capacidade de identificar originalidade”. E quando identificarmos, o que faremos? Para ele, direito autoral é uma “discussão perdida”.
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