Uma nova análise do planeta anão Ceres, feita com a ajuda da Inteligência Artificial (IA), está mudando o que se pensava sobre a origem das moléculas orgânicas presentes no objeto. 

Utilizando dados da missão Dawn, da NASA, pesquisadores mapearam regiões ricas desses compostos para entender se eles surgiram dentro de Ceres ou vieram de fora. Os resultados, relatados esta semana em um artigo publicado na revista AGU Advances, sugerem que esses “blocos de construção da vida” podem ter sido entregues por impactos de asteroides.

O que torna Ceres especial?

Ceres é o maior objeto do cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter, representando 25% da massa total dessa região. Já foi considerado um asteroide, mas, em 2006, seu status foi alterado para planeta anão devido a suas características únicas. Entre elas, destaca-se o criovulcanismo, um tipo de atividade vulcânica onde gelo e substâncias voláteis são expelidos em vez de lava.

Esse aspecto levou cientistas a acreditar que os compostos orgânicos encontrados em Ceres poderiam ter vindo de seu interior. No entanto, a nova análise baseada em IA aponta para outro caminho.

Como a IA ajudou na descoberta

A missão Dawn orbitou Ceres de 2015 a 2018 e coletou um vasto conjunto de dados. Os primeiros estudos indicaram a presença de compostos orgânicos ao observar como diferentes áreas refletiam luz em determinados comprimentos de onda. Materiais orgânicos, especialmente hidrocarbonetos, tendem a refletir mais luz em faixas específicas, permitindo sua identificação a distância.

No entanto, os dados não eram precisos o suficiente para determinar o tipo exato de moléculas. Com o uso de IA, os cientistas puderam reanalisar todo o conjunto de informações de forma sistemática, identificando padrões que passaram despercebidos anteriormente.

Os novos resultados mostraram que os compostos orgânicos não estavam ligados a regiões de atividade criovulcânica, o que contradiz a teoria de que vieram do interior do planeta anão. Além disso, não foram encontrados sinais de atividade geológica recente, como fissuras ou vulcões, nos locais onde os compostos estão presentes.

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Superfície do planeta anão Ceres. Os locais de material orgânico estão destacados em vermelho. A maioria deles é encontrada perto da cratera Ernutet no hemisfério norte. Crédito: MPS

“Os depósitos orgânicos que foram detectados de forma confiável com a Dawn até agora provavelmente não originam Ceres em si”, explica o cientista Andreas Nathues, coautor do estudo, em um comunicado, reforçando que uma futura missão de aterrissagem seria necessária para detectar material orgânico do interior do objeto.


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De onde vieram os compostos orgânicos?

A maior concentração de material orgânico foi encontrada perto da cratera Ernutet, no hemisfério norte de Ceres. Algumas outras manchas foram identificadas a certa distância, sendo que duas delas eram desconhecidas até então.

Diante disso, os cientistas sugerem que esses compostos podem ter sido trazidos por impactos de asteroides do cinturão externo. Simulações de computador reforçam essa hipótese, indicando que colisões de asteroides com Ceres ocorrem com baixa velocidade, gerando pouco calor e permitindo que os compostos orgânicos sobrevivam sem serem destruídos.

Se o estudo estiver correto e os compostos orgânicos de Ceres vieram mesmo de asteroides, isso sugere que materiais semelhantes podem ter sido distribuídos por outras partes do Sistema Solar, inclusive em direção à Terra. Esse processo pode ter desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento da vida em nosso planeta.